sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Jean Wyllys de Matos Santos, Alagoinhas, nascido no dia 10 de março de 1974, é professor, jornalista, escritor e politico eleito em 2010 para mandato de deputado federal pelo PSOL do Rio de Janeiro a partir de fevereiro de 2011. Wyllys construiu alianças politicamente estratégicas e, em virtude do sistema eleitoral brasileiro, foi beneficiado pela expressiva votação de seu companheiro de partido Chico Alencar, que obteve mais de 240 mil votos.

Gay assumido, Jean Wyllys defende os direitos humanos durante sua carreira política, e está entre os três políticos que mais bem representaram a população no Congresso Nacional este ano, na avaliação dos profissionais de imprensa, de 55 veículos, que votaram na primeira etapa do Prêmio Congresso em Foco. A classificação final será definida pelo internauta, em votação que começou na internet na última segunda-feira (22).
Em entrevista exclusiva ao Gay1 para o colunista Roberto Dias, Wyllys fala sobre a polemica da foto para a revista "Rolling Stone" e a frase: "Já escrevi meu nome na história" e muito mais...


Gay1- Na última entrevista à Rolling Stones, você tirou fotos usando a indumentária do Che Guevara, por que não usar referências de Harvey Milk ou de Luiz Mott? Por que Che Guevara?
Jean Wyllys - Bem, eu esperava sair como Jean Wyllys, mas a revista tem, historicamente, como procedimento, transformar os seus entrevistados em personagens. Eles tinham dois personagens: o Harvey Milk e o Che Guevara. O Che pela figura da revolução. A intenção do jornalista era falar sobre: “sua” cruzada, sobre a revolução que você vem provocando e como o ano de 2011 é da temática LGBT; é uma revolução, “você” toca sozinho, é uma cruzada...e ao mesmo tempo “você” não perde a ternura; “você” tem um jeito tenro de lidar com isso. Enfim, ele me deu essas duas opções. Eu optei pelo Che, exatamente, por esses argumentos. E além desse argumento, tem a figura do Che que é um ícone muito pop, foi monopolizado por uma mentalidade machista. A própria revolução cubana sacrificou os homossexuais, mandou os homossexuais para o paredão, considerava-os antirrevolucionários... a revolução promoveu isso. Olha, “eu vou fazer uma provocação pública dessa matéria”, da figura do Che Guevara. Primeiro tratei da idéia de que não só héteros têm heróis, nós podemos forjar os nossos e podemos questionar os heróis postos. Da mesma maneira que o Luiz Mott chamou a atenção para a sexualidade de Zumbi dos Palmares provocando a ira do movimento negro...eu quis provocar a esquerda brasileira, posando de Che Guevara. Então, esta ala esquerdista que se diz tão progressista, tão revolucionária, está preparada para preparada para incluir a temática LGBT? A luta por justiça social tem que seguir um único viés econômico, ou ela tem que seguir o viés das liberdades individuais? Em que medida o PSOL, o partido que é o meu, que é do socialismo de liberdade, está preparado para lidar com a figura de um Che Guevara gay? Então essa foi a ideia de posar de Che Guevara. E o Che é uma figura pop mundial, fácil de identificar. O Harvey Milk, não. Ele é uma figura muito nossa, da comunidade LGBT.

Gay1- E se tivesse a oportunidade de escolher uma personalidade, qual seria?
Jean Wyllys - Olha, para falar a verdade eu escolheria o Che Guevara. De verdade. Nós não temos grandes heróis gays pra que eu pudesse encarnar...Alexandre Magno!!? Enfim, eu acho que tiraria do contexto político que a matéria tem e que eu queria dar. E a brincadeira em torno do Che foi interessante. Uma pena que houve uma infrainterpretação por um lado e uma superinterpretação de outro lado. Eu não entendi por que alguns ativistas reclamaram: Por que ele posou de Che Guevara? Pareceu-me tão óbvio que ali era uma provocação em torno da figura, do ícone; de provocar as “esquerdas” brasileiras...no momento que a gente está para instalar a comissão da verdade, da memória; recuperar, por exemplo, aquele passado da ditadura militar e do fortalecimento das esquerdas na clandestinidade em que Che teve um papel fundamental no momento que a gente está instalando essa comissão, que vai recuperar isso. Por que não recuperar também a atuação dos gays naquele período? Que tá uma coisa silenciada. Como os aparelhos de resistência se comportaram em relação aos homossexuais? Será que eles herdaram a postura da revolução cubana de achar que homossexuais eram antirrevolucionários? Como aconteceu, por exemplo, na Argentina em que os aparelhos de resistência, às vezes, não queriam filiar homossexuais porque achavam que eles cediam facilmente à tortura? Enfim, a idéia era provocar essa discussão toda. Aí quando coloco que foi feita uma infrainterpretação, é porque as pessoas ficaram no óbvio.

Gay1- A sua luta é solitária, dizia a revista? Você acha que sua luta é solitária?
Jean Wyllys – Isso não foi uma decisão minha. Foi idéia do editor da revista. Mas em nenhum momento eu falei que minha luta era solitária. Eu acho que ele pensou na luta solitária que venho empreendendo. A questão de que sou o único homossexual assumido no Congresso Nacional. Se há outros homossexuais no Congresso, eles estão no armário. Quando você está no armário e silencia sobre sua identidade sexual, ela não existe. Só existe aquilo que tem nome. Quem não é assumido não é. A perspectiva do solitário foi nesse sentido. É claro que minha luta é um contínum de uma luta que me antecede. Aliás, no próprio texto eu afirmo que somos filhos das conquistas de Harvey Milk e Harvey Milk é filho das manifestações, das conquistas dos anos 20, dos movimentos gays, do movimento feminista. No Brasil temos o trabalho pioneiro do pessoal do Lampião da esquina, o João Silvério Trevisan. Aguinaldo Silva que hoje tem dado declarações polêmicas, mas é impossível não reconhecer o passado de Aguinaldo Silva. Temos as próprias constituições da ABGLT, da LBL, dos grupos ativistas de uma maneira geral. Não existiria Jean Wyllys se não houvesse esse povo todo. Eu acho que a perspectiva da revista da luta solitária é a luta solitária como único deputado. Antes desta entrevista, eu estava reunido como os articuladores da Frente Parlamentar LGBT, do qual o único parlamentar a participar, sem representantes, sou eu. O que quer dizer que eu sou muito mais sensível a esta parte por pertencimento. Os outros deputados não têm essa aproximação, esse pertencimento. Vem com esse distanciamento. Eles vão se dedicar apenas até a página dois.


Gay1- Temos agora uma presidenta. Você acha que se tivéssemos um presidente gay, as coisas poderiam ser diferentes?
Jean Wyllys- Olha, eu acho que as nossas identidades, a maneira como estamos posicionados na sociedade, não interfere nas nossas ações, na maneira como observamos o mundo. O fato de a Dilma Roussef ser mulher, isso não interfere na visão que ela tem. Na própria constituição das políticas públicas, no andamento, nas escolhas que ela faz. A escolha que ela faz em seus Ministérios é uma escolha que não está livre da determinação dessa condição de mulher. Um presidente gay, essa condição, estaria presente na sua visão de mundo. Além de ter a identidade de gênero masculina, a orientação sexual iria interferir; faz a diferença. É claro que faz. É...mas eu acho que não faz uma diferença... substancial. Não quer dizer que essa condição de mulher, de homossexual vá tornar o governo mais vulnerável, num governo melhor, nem melhor nem pior, seria diferente. Ponto. A Fundação Perseu Abramo fez uma pesquisa em que constatou que o eleitorado brasileiro é conservador, que não vota, especialmente para cargos majoritários, em candidatos que se digam: ateu, que professe religiões de matizes africanas, que defenda a legalização do aborto, da maconha e que apóiem o casamento civil gay. Ele pode até votar num candidato gay, mas que não apoie o casamento civil. Essa pesquisa pode ser falha, mas com informação, com o acesso as tecnologias da informação, com educação oferecida as pessoas, pode ser que esta situação mude.
O fato de a Dilma fazer um bom governo. Eu espero que ela faça um bom governo! Vai mostrar que sim, as mulheres têm capacidade de governar. Eu acho que minha atuação como parlamentar vai mostrar que o povo não tem que ter medo em votar em gay. Ele vai assumir e vai coordenar uma legislatura pautada no espírito republicano, dentro do mais fiel e autêntico espírito republicano, lutando pela coletividade.

Gay1- Ainda sobre a Revista, você falou que escreveu seu nome na História. Você acha que seu trabalho terminou?
Jean Wyllys – Não, essa frase... engraçado, na verdade, foi o repórter que disse: “ você tem noção do que já fez, de que você já escreveu seu nome na História?”
Porque a pedra de toque da democracia do mundo inteiro, hoje em dia, é a luta pelos direitos sociais. Depois dos movimentos dos trabalhadores, do movimento das mulheres, dos negros, chegou a hora dos homossexuais.
Depois o repórter disse: “olha você está sendo o pioneiro!” Mas tem o trabalho da Marta Suplicy que é inegável, da luta dela. Ela é pioneira em trazer o assunto para o Congresso. E o interessante é que a Senadora não é gay. E isso faz uma diferença enorme. Isso é histórico. E foi por isso que o repórter falou sobre a luta solitária. Aí eu respondi a ele dizendo que eu havia ouvido do Deputado Regufe a mesma colocação sobre minha contribuição como parlamentar que “já havia deixado seu recado”. Mas, como assim?, eu respondi. Meu mandato ainda está no começo!
A mesma coisa ouvi da Deputada Erika Kokay. Então eu pensei comigo sobre essa perspectiva e realmente eu escrevi meu nome na história, mas não foi com uma perspectiva arrogante, longe de ser; e pretensiosa, mas existem coisas que são ditas, que têm que ser ditas. Temos a experiência do Clodovil, mas ele não encampou a luta pelos direitos dos homossexuais. Eu sou o primeiro a fazer, e isso é História.
Eu não entendo... engraçado que existe uma cobrança e não é externa, ela vem de uma patrulha da própria comunidade LGBT. Os heterossexuais entenderam a mensagem da revista. Engraçado que essa patrulha tão crítica e afiada, não está afiada no despertar da consciência política. Eu queria ver cada ativista na luta pela consciência política, de lutar contra a homofobia internalizada, e pra que no futuro, nas próximas eleições, tenhamos uma bancada LBGT.


Gay1- Um partido talvez?
Jean Wyllys – Eu não acho que precise de um partido, de maneira específica. Eu acho que a luta específica dos direitos civis dos homossexuais dever estar ligada a uma perspectiva mais ampla dos direitos civis e liberdades. Então não temo como lutar contra o conservadorismo se você não se você não articular a luta pelos direitos dos homossexuais a luta das mulheres; se você não enfrentar a misoginia, o sexismo; se você não enfrentar o racismo, a xenofobia, o antissemitismo. Então justiça social! Então a provocação com a foto do Che Guevara é um pouco essa. Lutar pela justiça social. É lutar contra a oposição clássica entre trabalhador e patrão, essa opressão que é econômica e pensar na temática das liberdades civis. Então é nesse que sentido que não deveria existir um partido.mas o movimento deveria estar atento para despertar a consciência, em...você sabe que não fui eleito pelos LGBT’s; eu fui eleito por uma conjunção de astros. Não tive apoio de empresários, articulações...Fiz uma campanha barata, que não custou quase nada. Foi invisível, feita nas redes sociais, num partido sem coligações como o PSOL. E ainda assim, todo o partido fez um voto de legenda, que garantiu a eleição do primeiro mais votado, o deputado Chico Alencar, que está no quarto mandato, e eu, estreante, no segundo lugar. Os LGBT’s não votaram em mim, mas mesmo assim eu mantenho meus compromissos assumidos durante a candidatura. está lá nos folders, na internet. Todos meus compromissos estão sendo mantidos pela luta dos direitos humanos. Eu estou lutando por aquilo que acredito. Eu professor, jornalista e deputado luto pelos direitos humanos, e o fato de ser homossexual me faz lutar especialmente pelos direitos dos homossexuais. Eu acho que é dessa maneira que a gente avança!


Gay 1 -E a respeito da religião, o que você acha das Igrejas Inclusivas?
Jean Wyllys – Eu acho esse movimento interessante. A religiosidade é um componente, digamos assim quase uma constância antropológica. Todas as culturas desenvolveram as religiosidades que se materializaram em religiões organizadas institucionalmente muitas vezes. Outras não, não desenvolveram ao ponto de institucionalizar, mas essa relação com o sagrado que tem a ver com medos ancestrais, a consciência da morte, a consciência de que se vai morrer, a consciência da passagem do tempo. Tudo isso leva a gente a ter uma relação com o sagrado, com o plano extramaterial. Não há cultura sem Religiosidade. Portanto, eu diria que ampla maioria dos seres humanos se inclina a ter uma religiosidade.
Eu fico feliz que, no ocidente, cuja a cultura está sustentada na herança judaico-cristã – digamos assim – as igrejas cristãs abrem suas portas aos homossexuais: as igrejas inclusivas. Porque justamente uma das violências que se pratica contra os homossexuais é negar-lhes o direito à religiosidade. O direito que o homossexual tem de acreditar na divindade de Jesus e de professar essa crença. Eu acho que é uma violência que é praticada contra ele. Ou exigir que para professar sua crença, ele tenha que esconder sua sexualidade; tenha que recalcar seu desejo. Isso é uma violência que se pratica! Então fico feliz com a BETEL, de existir a Igreja Cristã Contemporânea, de haver um braço da Igreja Católica, que agora é a diversidade católica, que tem como representante o Padre Júlio, da PUC-RJ, abrir-se para essa questão da homossexualidade. Fico super feliz, porque, antes, as únicas Igrejas inclusivas eram a Umbanda e o Candomblé que abriam as portas, sem preconceitos, para os homossexuais porque eles eram proscritos das religiões tradicionais.
Meu afastamento da Igreja Católica se deu por razões óbvias. Embora eu militasse ali com os movimentos da pastoral das comunidades eclesiais de base, por justiça social, pelo direito a terra...Lembrei, agora, de uma campanha da Fraternidade: Terra de Deus, Terra de irmãos, que a gente trabalhou ativamente - era o lema da campanha. Foi feita em Alagoinhas, a cidade em que nasci, era cheia de latifúndios, outros tantos sem terras e quilombolas. E a gente trabalhou muito nessa campanha. Então era isso, trabalhar pelo direito a terra. Trabalhar a campanha de 1988, por exemplo, que foi de ouvir o clamor desse povo que trazia a questão da negritude, da discriminação racial...Para mim, não fazia sentido trabalhar para essas pautas, se a Igreja não contemplava a violência que eu mesmo sofria. E eu sou gay. Eu levei um murro aos doze anos de idade. E justamente por que estava me deslocando para uma reunião da pastoral juventude estudantil. No meio do caminho um cara me deu um murro. Sem motivo, só porque ele viu em meu jeito a minha homossexualidade. Então, pra mim, não fazia sentido fazer parte de uma instituição na qual isso não era visto como injustiça, e pior ainda, que minha sexualidade era negada e silenciada a partir de argumentos bíblicos de uma leitura fundamentalista. Então naquele dia senti a incompatibilidade que existia, e eu me afastei. E depois de um período de aproximação do materialismo histórico, digamos assim, e de uma quase inclinação ao ateísmo...Eu entendi que não podia ser ateu. Tem uma coisa em mim que me leva a crer numa dimensão sagrada, divina. E, digamos assim, esse divino sobre o qual me debruço, não tem a face beligerante, masculina, do Deus judaico-cristão que foi forjado, especialmente do Deus apresentado e descrito no Antigo Testamento. O Deus que acredito é o Deus amor! É um Deus irmão. Agora recordo de uma canção quando eu era pequeno que dizia assim: “Toda Bíblia é comunicação de um Deus amor, de um Deus irmão!” É nesse Deus que acredito!


Gay1- Qual deles mais toca sua alma: o Jean escritor, o professor, o jornalista ou o parlamentar?
Jean Wyllys- (...) Cara, eu fiz escolhas na minha vida em que todas as minhas atividades se intercomunicam. O que eu faço como Deputado é comunicação. A política é comunicação! A política existe para mediar o conflito entre os diferentes. A política não existe para os iguais, ela existe para os diferentes. A política não existe nos homens, mas no espaço entre os homens. A política é comunicação.
O trabalho como professor universitário de Teoria da comunicação e Cultura Brasileira é de comunicação. O trabalho do jornalista é de comunicação. O trabalho do escritor é comunicação. Então, todos tocam minha alma de alguma maneira. Mas de todas essas atividades a que mais, digamos assim, justa, é o papel de Professor.
Ser Deputado faz com que me comunique também. E gosto quando o Professor e o Deputado se encontram e faz esse trabalho pedagógico. Também cabe ao legislador, esse trabalho pedagógico de iluminar as pessoas... A palavra aluno, que vem do latim, quer dizer: sem luz. Então o papel do professor é iluminar. Não com essa arrogância de que sabe mais, pois o professor se constrói também na interação com o aluno.
O conhecimento foi fundamental na minha vida. Sem o conhecimento eu não teria chegado até aqui. Eu sou uma pessoa fértil ao conhecimento. Gosto de aprender coisas novas. Cada viagem que faço é menos pelo prazer do turismo e mais pelo conhecimento.
Uma das coisas que mais me incomoda por ser famoso é a dificuldade que tenho com as pessoas. Porque aonde chego, chega o ícone. E o meu interlocutor, em geral, tem uma relação com o ícone que não abre espaço para o diálogo. Então, envolve o elogio, a admiração... e o que mais desejava é que as pessoas me vissem como um ser humano, igual a ela, normal. E que estabelecesse uma relação de diálogo. Nada mais prazeroso para um escritor do que conhecer pessoas.
Você agradece os elogios. Mas é difícil pra mim. Eu fico sem graça. Eu sou pisciano. Quando recebo um elogio fico todo apatetado. Eu não sei o que dizer.
Gay 1

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